Para o grande público, o Pink Floyd está associado principalmente à duas figuras-chave para a banda: o baixista Roger Waters e o guitarrista David Gilmour. Mas, sem um outro músico, o Floyd nem sequer teria existido. Syd Barrett foi não só o fundador, mas o primeiro guitarrista, vocalista e principal compositor do quarteto britânico em seus anos iniciais (e também quem o batizou). Mesmo depois de sua saída do grupo, em 1968, devido a complicações relacionadas ao uso abusivo de LSD e outras drogas (que despertaram sua adormecida esquizofrenia), Syd continuou como uma espécie de sombra pairando sobre a banda. Músicas foram inspiradas em suas concepções artísticas e outras criadas em sua homenagem.
O impacto da curta, porém intensa, carreira musical de Barrett afetou tanto os outros integrantes do Floyd quanto o rock inglês da época (e de posteriores gerações também) e, mais especificamente, a emergente cena psicodélica. O tempo tratou de transformar Syd Barrett em um ídolo misterioso, pois no começo dos anos 1970 ele retornou para a casa da família, em Cambridge, afastou-se dos antigos amigos e da música e passou a viver isolado, mantendo pouco contato com o mundo exterior, dedicando-se apenas à pintura, sua primeira paixão. Nunca mais deu entrevistas. Morreu em 2006, supostamente de complicações ligadas ao diabetes.
Por todo esse contexto, o interesse por Syd Barrett é imenso. E para quem gosta do músico, a boa notícia é a chegada de Pink Floyd: primórdios às livrarias brasileiras. Como o título deixa claro, o livro aborda o começo da banda (de 1965 a 1973, precisamente), mas dos 12 capítulos, 10 têm Syd ainda como líder da banda. Seus dois discos solo, ambos de 1970, também ganham atenção na obra escrita pelo inglês Barry Miles(1). Syd, pelos motivos enumerados, é o foco da publicação, mas Waters, Gilmour, o baterista Nick Mason e o tecladista Richard Wright (1943-2008) também estão lá, com inúmeras informações biográficas e sobre suas atuações no Floyd.
Psicodélico
O Pink Floyd surgiu em 1965, da união dos amigos Roger “Syd” Barrett e Roger Waters, ambos jovens de Cambridge estudando em Londres, o primeiro, artes plásticas, o segundo, arquitetura. Depois de algumas formações, o grupo se estabeleceria com a entrada de Wright e Mason (também alunos de arquitetura). O repertório inicial, composto principalmente de números de R&B, longo se expandiu para uma orientação mais livre, com influências de rock, jazz e música oriental. Com a ajuda de projeções e luzes psicodélicas em suas apresentações, logo a banda conseguiu uma boa reputação no underground londrino e, pouco depois, os primeiros singles, o álbum de estreia (o clássico The piper at the gates of dawn, de 1967) e shows pela Inglaterra e Europa. Depois, Syd foi substituído por Gilmour. Até aqui, nada que um fã da banda não saiba.
Mas Miles leva o leitor além, contando sobre a infância e adolescência dos músicos, o ambiente onde cresceram, seus discos, livros e poetas favoritos, as primeiras experiências com drogas, namoradas, suas bandas pré-Floyd e a decadência mental de Barrett.
A lenta ascensão do grupo ao estrelato é explicada como uma reação direta à postura da banda, que não queria gravar singles pop de três minutos para as rádios, mas longas faixas, esculturas de som, para serem ouvidas com o restante do álbum, como uma obra completa. O público jovem, cansado dos velhos formatos do indústria musical, logo embarcaria na proposta da banda, culminando no sucesso comercial alcançado no começo da década de 1970. Em 1973 é lançado The dark side of the moon, um dos discos de rock mais populares de todos os tempos.
Barry Miles conta toda essa história com riqueza de detalhes e muitos depoimentos, tanto dos integrantes da banda, quanto de outros músicos e amigos próximos. Miles foi testemunha ocular do começo do Floyd e escreveu o primeiro artigo publicado sobre o quarteto. Uma pena a edição brasileira não ter uma lista das fontes bibliográficas. Não fica muito claro quando os depoimentos foram dados diretamente ao escritor ou quando são reproduzidos de entrevistas antigas. Um texto introdutório também seria bem-vindo. Mas se Pink Floyd: primórdios (publicado lá fora em 2006) tem um problema é a tradução, claramente feita por alguém que não conhece o universo do rock (resultando em um uso equivocado de suas terminologias). Além disso, algumas vezes o texto soa duro, como se carecesse de algumas adaptações. São detalhes que não estragam o prazer da leitura. Até porque, além das informações, o livro apresenta um rico acervo fotográfico.
1 – O cara das palavras
Barry Miles tem 67 anos e viveu intensamente os anos 1960. Conheceu e trabalhou com alguns dos principais protagonistas do rock da década. Ele é autor de biografias sobre John Lennon, Paul McCartney, William S. Burroughs, Jack Kerouac, Frank Zappa, Charles Bukowski e Allen Ginsberg. Escreveu também Hippie (inédito no Brasil) sobre a geração do amor.
Fonte: Correio Brasiliense
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