Como está sendo pra você este momento de celebração dos 40 anos da Jovem Guarda?
Tenho feito muita coisa. Estou numa correria meio louca, porque eu faço os meus shows, independentes da Jovem Guarda, e tô acompanhando este projeto de Jovem Guarda. Além disso, estou separando repertório… pois vou gravar um CD e um DVD de músicas inéditas, porque já faz muito tempo que eu não gravo… por opção, né? Como eu tenho 24 LPs lançados, a BMG – que comprou a RCA – resolveu lançar um ou dois CDs meus anualmente, sejam eles relançamentos de discos originais ou mesmo coletâneas. Então todo ano tem lançamento de CD, geralmente compilando… e mês passado saiu um muito interessante, chamado “Vanusa Diferente”, em que eu canto somente canções de compositores de MPB. Muita gente não conhece esse meu lado, conhece apenas meu trabalho de “Paralelas”, “Manhãs de Setembro” etc. Nesta coletânea há faixas de Luiz Melodia, Zé Ramalho, Chico Buarque, João Bosco, Caetano Veloso, Milton Nascimento etc, então é um CD bem bonito.
Isso te estimulou a fazer um show específico? Ou você já cantou MPB em show antes?
Sabe o que aconteceu? Minha filha Aretha está gravando um CD e um DVD em homenagem aos 60 anos do Antônio Marcos. Eu tô vendo ela há dois anos correndo atrás de patrocínio, naquela loucura. Conversei com meu marido e ele falou: “Escuta, eu acho que você está na hora de você gravar um CD, não? Deixa eu te mostrar uma música!” A primeira música dele que ele me mostrou, eu quase caí de costas. Chama-se “Close”. Ele toca muitos instrumentos, é maestro e arranjador e procurou amigos grandes compositores… pedindo música. Inclusive hoje ele me ligou, porque foi comprar cordas pra guitarra e encontrou a Ana Carolina. Ele a convidou pra participar do meu DVD e ela aceitou, então ele tava louco de alegria. “Ela vai ver se tem uma música pra você!” Então, maravilha. Estar casada com um maestro é outra coisa, porque ele estuda quatro ou cinco horas por dia… e isso me entusiasma. Ele me influencia de uma forma muito boa, primeiramente porque a gente viaja junto. É muito difícil ter um relacionamento quando se é cantora, porque se não viaja também você fica muito tempo longe, né? Não dá pra engrenar um relacionamento, então… sendo ele músico, a gente viaja junto e faz show acústico também. É um barato, a gente viaja o Brasil todo. Esse projeto a gente está fazendo aos poucos, esperando repertório. Já temos cinco músicas do Sérgio Sá, todas ótimas… Já compus com ele, afinal ele tocou na minha banda durante cinco anos. Ele mandou cinco músicas maravilhosas e eu não sei o que faço, talvez eu tenha que escolher no sorteio… porque todas são lindas, né?
Ou então grava todas e monta repertórios diferentes no CD e no DVD.
A idéia é essa, no DVD eu pretendo gravar os sucessos – “Manhãs de Setembro”, “Paralelas”, “Pra Nunca Mais Chorar”, “Mudanças”, “Súplica Cearense” etc. Umas sete. Aí mando o CD novo também.
Você já fechou com alguma gravadora?
Não, a gente ainda está no comecinho do projeto… e as coisas estão vindo. Eu sempre primeiro tenho que escutar a música muito boa, que eu goste… ou então que eu mesmo faça. Aquela música servirá de parâmetro para as outras, muito embora eu procure não fazer discos monocórdicos – com as coisas sempre iguais etc. Tem que ter um pouco de balanço, eu gosto de sempre botar uma regravação – afinal eu fui a primeira a regravar, numa época em que ninguém fazia isso. Não existia essa coisa de regravar música, então eu fui a primeira na história da música… quando regravei “Mensagem”, da Isaura Garcia, e em seguida “Súplica Cearense”, do Gordurinha. Graças a Deus, eu tenho uma boa abertura na mídia e resolvo se vou ou não gravar.
Sabe quando você sabe que vai “e matar”? Fazer um disco é como gerar uma criança, pra mim é como gerar um filho. Às vezes o CD sai e não acontece nada, porque a gravadora não se mexe e não ajuda. O que é que a gente vai fazer? A gente vai conseguir patrocínio – já tem algumas coisas engatilhadas – e, se a gente não conseguir, a gente vai tentar a Lei Rouanet… porque, de alguma maneira, a gente vai fazer, entendeu? Quanto ao CD, só entram só as inéditas… enquanto que no DVD haverá os grandes sucessos também. Eu ainda não tenho nenhum DVD meu, embora no DVD da Jovem Guarda – gravado no Canecão ano passado – eu também esteja. Vai sair agora, já está fabricado… e acho que sai no máximo em um mês.
O que você acha destes projetos comemorativos?
Ah, eu acho o máximo participar… porque eu peguei a Jovem Guarda no final. Eu era da Excelsior, que fazia concorrência pra Jovem Guarda – que era da Record. Então o pessoal do Roberto não chamava ninguém da Excelsior pra cantar no programa dele… e a produção da Excelsior também não chamava ninguém da Record pra cantar. Éramos Incríveis, Vips, Tony Angeli, Marcos Roberto etc, aí o que é que aconteceu? Eu gravei “Pra Nunca Mais Chorar” e estourou… e aí a produção da Record me convidou pra fazer o Jovem Guarda, que foi uma coisa inédita. Eu quase morri, mas fui lá e fiz um primeiro programa. Aí me convidaram pra fazer o seguinte e eu pensei “tô feita!”, afinal aquele era o sonho da minha vida. Mas só que o segundo programa que eu fiz acabou sendo o último do Roberto, não teve mais… e eu peguei a rabeira mesmo, né? Nessa volta, com todo mundo falando de Jovem Guarda, a primeira vez que juntou todo mundo foi em 2002 ou 2003, num show com todo mundo no Anhangabaú. Só não tava o Roberto, mas tava todo mundo da Jovem Guarda. Foi uma realização da Prefeitura de São Paulo, e acho que vai sair agora em CD… Estou com o contrato lá em casa, está sendo agilizado pelo Dercy… Na época a gente nem esperava que saísse, mas vai ser muito bom… porque foi o primeiro, né?
Em 1995 houve aquele projeto de 5 CDs, produzido pelo Márcio Antonucci, e que rendeu uma turnê e até um CD ao vivo depois.
Começou com aquilo, inclusive lá eu cantei uma música do Roberto, “Quando”. Aí, é lógico que ele começou antes, mas depois também houve este show… que foi maravilhoso, porque todo mundo se encontrou. O que eu acho que é muito forte na Jovem Guarda é que, naquela época, a gente chegava tipo 2 da tarde na televisão… e o programa só entrava no ar horas depois. Então a gente tinha muito tempo pra ensaiar, pra bater papo, pra trocar idéia, pra compor com outro artista e pra fazer realmente uma amizade. Agora a gente não tem, porque – quando eu chego na televisão – vamos supor, o Jorge Vercilo, que eu adoro, tá cantando… Eu tô chegando e ele tá saindo, a gente se fala rapidinho… e você não tem tempo nem de conversar! Então, quando a gente se encontra, a Jovem Guarda é um ti-ti-ti. Outro dia eu, Martinha e Waldirene nos encontramos para fazer uma foto na semana passada… e demos cada risada, que o fotógrafo teve que pedir pra gente parar. Este show são apenas dois nomes dividindo o palco, mas normalmente sempre pinta show com de quatro a oito artistas.
Juntar todo mundo é muito caro, por causa dos custos de produção…
… além da fogueira das vaidades, também…
Este talvez seja o maior problema, não?
É um problema total… “Ah, se fulana for eu não vou!” Tem essas coisas, é lógico tem que ter.
Sempre existiu isso, não é?
Eu não sei, eu não tenho problema com ninguém.
Na época não tinha isso?
Tinha sim…
… mas entre as mulheres, principalmente…
Não, eu nunca tive problema com nenhuma delas.
O que é isso? Não existia rivalidade entre as louras?
Não, imagina! Wanderléa não era loura na época… (risos)
Mas existiam outras… Rosemary… Waldirene…
É, tinha a o Rosemary… e eu não suportava a Rosemary! (risos) Waldirene era minha amiga, mas eu não suportava a Rosemary. Depois eu fiz amizade com ela, trabalhei com ela e tudo mais, mas eu não suportava… Achava horrível, não gostava dela. Um dia fui fazer um programa e ele me perguntou que nota eu daria pra Rosemary… (rindo) … e eu falei: “Como cantora, ela é uma linda mulher!” (rindo) Era besteirinha, coisa de começo de carreira, mas depois a gente vai conhecendo o pessoal.
Você falou que pegou a rebarba da Jovem Guarda. Como você começou?
Meu trabalhava com som e um dia levou-me com ele, pra ver a banda de baile The Golden Lyons. Eles saíram pra tomar cafezinho e deixaram tudo ligado. Eu fiquei sentada, sozinha no salão, olhando para aquela guitarra… e aí fui, subi e peguei a guitarra devagarinho. Comecei a cantar uma música francesa e lá do bar todo mundo se perguntou: “Quem é que tá cantando?” Vieram correndo, me viram tocando e aí o dono da banda disse pro meu pai: “Pelo amor de Deus, você vai deixar sua filha cantar na banda!” E aí lá ia eu e meu pai, junto com a banda, viajando por todos aqueles lados de Minas. Então eu comecei dando canja, pois eu ia aos bailes, mas não pra dançar ou pra namorar: eu ia pra cantar com a banda. Mas não gravamos nada. Já estava começando a música jovem, já existia Wanderléa. Nós morávamos em Uberaba, depois fomos para uma cidade menor chamada Frutal – eu, meus pais e minha irmã mais velha. Num desses bailes, que era aniversário da cidade, eu fui convidada pra representar São Paulo no desfile à tarde… aquelas coisas de cidade pequena, em cima de um carro etc.
Havia um empresário de Frutal que já morava em São Paulo, e que conhecia a firma Magaldi & Maia. Ele me viu no desfile e à noite me viu de novo no baile, então ele me procurou dizendo “eu gostaria de levar você pra São Paulo”… e então eu respondi “ah tá bom, fala ali com o meu pai!” Achei que fosse uma cantada, é lógico… mas aí ele chegou pro meu pai, conversou com ele e disse que me levaria para fazer um teste. Ele topou, eu já tinha 19 anos e nós viemos. Eu fiz uma sessão de fotos, cantei pra eles e eles disseram: “A gente tá lançando o Ronnie Von em cima do Roberto Carlos… e nos disseram que você canta igualzinho à Wanderléa!” Eu imitava a Wanderléa, mas aí eu falei: “Olha, se for pra imitar a Wanderléa eu não vou gravar não! Vocês estão querendo acabar com o Roberto e com a Wanderléa?” Eles responderam: “Não, a gente queria lançar dois novos produtos…” Eles tinham trabalhado com Roberto e com a Jovem Guarda, mas já tinham saído… e aí cantar como Wanderléa não me interessava, porque ela era meu ídolo. “Se vocês me quiserem, é com a minha voz!” Meu ficou me cutucando com o pé por baixo da mesa e eu falei: “Pai, não adianta o sr. me cutucar… porque eu não vou cantar igual à Wanderléa. Se eles não quiserem me contratar, não me contratem… porque eu tenho a minha voz!” Eles falaram: “Bom, ela tem personalidade!” E meu pai respondeu: “Se tem…” Aí eles me levaram para um empresário, o Arnaldo Saccomani, e ele começou a me colocar nos programas. Eu fui pra Excelsior e não parei mais.
Carlos Imperial fez “Pra Nunca Mais Chorar”.
É, porque eu comecei a cantar na televisão sem ter música pra trabalhar. Na primeira vez em que cantei na televisão lá na Excelsior em São Paulo, me escolheram “Hello Dolly!” Aí o Imperial falou pro Eduardo Araújo: “Nós precisamos fazer uma música pra Vanusa!” Ele tinha uma, cantou e eu adorei. Gravei o compacto, com “O Geghege” de Brenda Lee no lado B. Quando eu comecei a trabalhar “Pra Nunca Mais Chorar”, ainda não havia disco na loja… e foi um puta marketing. Todo mundo chegava nas lojas e perguntava, e quando saiu foi um estouro… e até hoje eu tenho que cantar.
E logo depois você fez seu primeiro LP, que é o único que pode ser considerado verdadeiramente jovenguardista, não?
Sim, porque os outros já estavam me encaminhando para um outro lado… porque eu queria ir pra MPB. Aí, anos mais tarde, depois que eu gravei “Amigos Novos & Antigos”, dali pra frente eu me perdi… porque daquele disco estourou “Paralelas”, que já era num estilo bem mais MPB. Dali eu podia ter seguido, mas eu saí da gravadora e fui para uma outra, onde eu não conhecia o produtor, e aí ele queria que eu gravasse determinado tipo de música etc. Foi ficando complicado, porque – quando você trabalha muito tempo na mesma gravadora – você tem o mesmo produtor, os mesmos músicos e já está acostumada com os arranjadores. Pra mim, é muito difícil conhecer uma pessoa e ela ir logo produzindo meu disco. Tem que me conhecer muito, porque é muita de alma e de essência. O produtor tem que gostar do meu trabalho, pra tirar de mim o máximo que puder… mas com muito cuidado, porque a gente é muito sensível. Eu acho muito difícil… e eu tive vários produtores, então dali pra frente eu me perdi.
Você falou que estar casada com seu maestro lhe estimula profissionalmente. Como foi estar casada com um cantor romântico como Antônio Marcos na época em que você buscava o caminho da MPB?
Foi uma coisa interessante, porque tínhamos o mesmo produtor. Wilson Miranda já era produtor do Antônio Marcos, e era um cantor com um senhor ouvido. Quando me casei com o Toninho, ele me falou: “Quem vai produzir teu disco agora é o Wilson Miranda!” E aí a gente tinha uma sintonia maravilhosa dentro do estúdio, fazendo vários discos juntos. Se a gente falasse que ia botar um outro maestro, não seria problema. Mas eu acabei saindo de lá, porque tinha um diretor argentino que eu detestava e cuja voz eu nem podia escutar. Mas, depois de minha passagem pela Continental, quando voltei pra RCA, os produtores já foram outros. Deu a maior briga, porque me disseram que eu não poderia ter dois produtores no disco. “Me explica, onde é que está escrito que eu não posso ter dois produtores dividindo as faixas?” Aí eu ouvi: “Sempre criando problema!” Mas tanto o Lincoln Olivetti quanto o Sérgio Sá haviam trabalhado comigo, tirando música etc, então eles tinham que estar lá. Depois, o Osmar Zan veio me passar uma idéia… Lembra de quando surgiram as Frenéticas? Elas eram o que eu era no começo da carreira, porque eu tirava a sobrancelha, pintava de vermelho, as roupas eram todas loucas etc. Tinha passado 5 ou 6 anos e me disseram: “O diretor quer que você grave uma coisa estilo Frenéticas!” Eu falei: “É o seguinte: eu vou lá no banco pegar aquele dinheiro que vocês me deram pra renovar o contrato… e vou trazer pra você… mas eu não vou voltar atrás, porque essa é a Vanusa daquela época… e eu não vou voltar! Deixem as Frenéticas em paz! Eu saio da gravadora, mas não gravo!” Não tem nada a ver, imagina eu gravar estilo Frenéticas! Eu tinha acabado de fazer disco com Paulo Coelho, que dentro do estúdio foi um dos melhores produtores que eu fiz. Leia o que ele escreveu na contracapa, naquela época ele não era escritor e hoje é muito chic dizer que tenho um disco produzido por ele! Mas eu tava tentando me manter na MPB…
Mas, depois disso, você ainda fez muitos discos nos anos 70 e 80.
Fiz, fiz, fiz… mas nenhum deu um grande estouro. Tocava lá em São Paulo, mas nunca foi um sucesso como “Paralelas”.
Mas você sempre teve uma vida de show.
Sempre, porque quem controla minha carreira sou eu mesma. Minha filha Amanda é minha empresária. Eu sempre procurei alguma coisa para estar ativa, e esse “estar ativa” me proporcionava estar sempre na televisão. Comecei a pintar, passei seis meses pintando, me convidaram para fazer uma exposição e aí fiz a primeira, numa época em que eu estava fora da mídia. Deu uma mídia danada e daí eu parti, fazendo 22 exposições por São Paulo. Voltei pra mídia e depois tava terminando um livro autobiográfico, então lancei o livro.
E você teve problemas judiciais por causa deste livro.
É… porque, na primeira vez que o lancei, o Wanderley Cardoso mandou um Oficial de Justiça lá no lançamento… pra dar IBOPE, né… e pra apreender o livro. Na hora em que o cara se anunciou, todo mundo saiu correndo pra comprar nas outras livrarias do shopping… e muita gente conseguiu comprar no dia, porque estava lotado de gente. Aí eu fui ver, eram três frases que ele não gostava, e eu resolvi não retirar… e fui brigar por aquilo. A gente brigou por um ano e, quando eu vi que ele não arredava o pé, eu retirei e relancei o livro – mas aí com novo título, e com alguém reescrevendo porque 500 páginas era muita coisa. Demos uma enxugada, sobrou muita coisa e aí eu montei um espetáculo, “Ninguém é Loura Por Acaso”. Fiquei nove meses em cartaz no Teatro Santa Catarina, ali na Av. Paulista, fazendo aquele monólogo sobre minha vida e cantando durante 1 hora e 40 minutos. Com isso eu descobri um lado engraçado meu, que eu não conhecia, porque as pessoas choravam de rir. Eu contava as coisas com humor, descobri a veia cômica.
Você já tinha experiência com dramaturgia?
Não, embora tivesse feito “Hair” com Antônio Marcos… no comecinho da carreira. Eu o conheci na RCA, a gente já estava gravando discos quando foi convidado pra fazer. A gente fez, foi uma experiência maravilhosa, naquela montagem com Nuno Leal Maia no elenco também. Infelizmente não se gravava disco disso, seria maravilhoso se tivessem gravado. Restaram apenas fotos, mas foram seis ou sete meses em cartaz… e foi muito cansativo, porque a gente também tinha agenda de shows etc. Amanda tinha acabado de nascer, além disso.
Vocês também fizeram cinema, vocês estão em “Com a Cama na Cabeça”, de Mozael Silveira.
Eu nunca vi isso na minha vida. Nunca ninguém sequer me falou disso. Lembro que fiz uma participação em “Pobre Príncipe Encantado”, do Wanderley Cardoso, cantando uma música.
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